Somos conhecidos em Portugal por termos empresas que pagam tarde e a más horas. O Estado dá o exemplo e atrasa-se nos pagamentos a fornecedores, o que traz sérios problemas na gestão de tesouraria das empresas. Como gerir o seu fundo de maneio?
Uma Má Gestão Do Fundo De Maneio Traz Endividamento!
As empresas, tal como as famílias, vivem confrontadas com elevados níveis de endividamento. Talvez a principal razão para termos empresas tão endividadas seja uma ineficiente gestão de tesouraria, que passa por definir claramente:
- Qual o prazo médio de recebimentos;
- Qual o prazo médio de pagamentos;
- Qual o nível de inventários que devemos comprar;
É certo que podemos ter uma clara definição destas 3 variáveis e mesmo assim ter incumprimentos. Começamos por ter atrasos de recebimentos que levam a atrasos de pagamentos. Mas será que este é o principal responsável? Ou será que deveríamos ter níveis mais elevados de capitais próprios?
O Que Significa Necessidades de Fundo de Maneio?
Por experiência própria, as razões invocadas pelos empresários sempre que recorrem aos apoios à tesouraria são as necessidades de fundo maneio, ou seja, a falta de liquidez existente na empresa, ou contabilisticamente falando, a necessidade de fundos para manter o ciclo operacional da empresa.
Deste modo, ocorrem necessidades de fundo de maneio sempre que existe um desfasamento entre compras e vendas e entre vendas e recebimentos. Parece-me assim claro que a fórmula das Necessidades de Fundo Maneio resume-se a:
NFM = Existências + Clientes – Fornecedores
De um ponto de vista meramente financeiro e de curto prazo, os empresários devem focar a sua atenção em ter uma conta de clientes perto de zero e uma conta de fornecedores tanto maior quanto possível. Assim temos os fornecedores a financiar a empresa, à semelhança do que fazem as empresas de retalho que recebem a pronto e pagam a 90 dias (ou mais).
Como Financiar O Fundo De Maneio?
A principal ferramenta para financiamento do fundo de maneio deve ser os capitais próprios da empresa. É certo que temos empresários descapitalizados mas o esforço deve passar por reforçar os capitais da empresa. Isto pode ser feito por aumentos de capital ou pela retenção de resultados transitados. O mesmo é dizer que devemos ter uns anos de poupança para fortalecer a conta bancária das empresas.
3 Indicadores A Acompanhar Regularmente
Se é empresário deve estar de olho constantemente em 3 indicadores de negócio que são fundamentais para analisar a solidez financeira da sua empresa. Não são os únicos mas são indicadores que são olhados com grande atenção pelas instituições financeiras quando dão crédito aos seus clientes. São eles:
- Prazo médio de recebimentos (PMR);
- Prazo médio de pagamentos (PMT);
- Prazo médio de existências (PME).
Cada um destes indicadores fornecem informação pertinente, pois se um empresário possuir um prazo médio de pagamentos inferior ao prazo médio de recebimentos significa necessidades de liquidez na empresa, ou seja, necessita de cumprir com as suas responsabilidades junto dos fornecedores antes de receber dos seus clientes.
Os Bancos de Olhos nas NFM
Para os bancos, as necessidades de fundo maneio e os indicadores relevantes, nomeadamente, PMR, PMT e PME são extremamente importantes e revelam informação de risco pertinente.
Do ponto de vista dos bancos existir necessidades de fundo maneio é normal e representa uma oportunidade de negócio, mas também revela que tais necessidades de fundo maneio, quando oriundas da má gestão, poderão representar aperto financeiro do empresário e consequente risco de incumprimento dos apoios à tesouraria concedidos.
O que Pode o Empresário Fazer
Nem sempre é fácil gerir a tesouraria de uma empresa e regra geral a pressão do mercado e as necessidades de resposta a oportunidades de negócio poderão, por certos períodos de tempo, pressionar as necessidades de tesouraria para níveis significativos.
Esta informação também é avaliada pelo banco, desde que o empresário forneça toda a informação relevante. Do meu ponto de vista é uma mais valia para o empresário partilhar a sua visão de futuro para a empresa com o banco sempre que surge a necessidade de solicitar ou negociar um apoio à tesouraria ou crédito bancário.
Retirando os bancos do processo de gestão de liquidez, surge assim diversas ferramentas para o empresário contrariar a pressão da liquidez que necessita para manter o ciclo operacional da sua empresa em funcionamento:
- Maximizar os prazos de pagamento e valores junto de fornecedores;
- Minimizar os prazos de recebimento e valores dos clientes;
- Minimizar as existências em stock e seus respectivos valores.
Dicas Úteis
- Negociação de prazos de pagamento mais longos junto dos fornecedores, quer seja através de negociação direta ou através de disponibilização de garantias junto dos fornecedores (desde que os custos não sejam significativos e a importância do fornecedores seja vital para a empresa);
- Criação de um sistema de cobrança e recebimentos eficaz de modo a diminuir os valores de clientes e prazos de recebimento, quer seja através de incentivos ao pronto pagamento ou incentivos a prazos curtos, ou em casos extremos, o recurso aos bancos para factoring desde que os custos não representem um encargo significativo;
- Elaborar um programa de gestão e controlo de stocks que se enquadre com a atividade da empresa e que não represente um risco para a mesma, quer seja através da aplicação de politicas just-in-time ou venda de mercadorias em consignação, com a criação de parcerias com fornecedores ou avaliação de fornecedores que se encontrem próximos do local produtivo de forma a minimizar as existências.
- Se tiver liquidez suficiente poderá negociar descontos para liquidação antecipada de faturas.
Outras Recomendações
Definitivamente, não existem muitas dicas e recomendações para este tipo de processo de gestão de liquidez que não tenham sido mencionadas anteriormente, todavia, do ponto de vista dos bancos existem dicas fundamentais para que os empresários não entrem em desespero financeiro.
Antecipar é Gerir Corretamente
Regra geral os empresários recorrem aos bancos solicitando apoios à tesouraria sempre que tais necessidades de fundo maneio surgem. Nestes períodos não possuem indicadores de liquidez a funcionar a seu favor, permitindo que os bancos analisem o risco da operação e proponham operações de crédito pouco vantajosas, como costumo chamar de, operações relâmpago.
Este tipo de operações se não analisadas com cuidado e simuladas na gestão empresarial, podem significar mais dificuldades do que soluções. Assim sendo, é imperativo que o empresário tenha em mente a antecipação de necessidades de tesouraria e detenham, como almofada, um pequeno apoio bancário.
Ao antecipar, os empresários possuem a oportunidade de negociar e analisar todas as propostas e procurar a melhor operação de crédito, que envolva menos custos e não tenha grande impacto financeiro.
Nem Todos os Produtos são os Mais Corretos
Comummente, os descobertos bancários e as contas correntes caucionadas são o produto proposto para gestão de tesouraria, todavia, é necessário que o empresário saiba exatamente quais os produtos que melhor se enquadram com os objectivos da empresa.
Por exemplo, se o empresário antevê que irá possuir necessidades de fundo de maneio porque alguns clientes não vão honrar com os seus compromissos então, entrar numa operação de desconto, como por exemplo, desconto de efeitos, cheques pré-datados ou factoring sem recurso poderá ser uma mais valia, desde que, avaliados todos os custos. De igual modo, se a previsão for meramente do lado da procura então um descoberto ou ainda uma conta corrente caucionada poderá ser o produto indicado.
Infelizmente nem todos os gestores bancários de empresas possuem a capacidade necessária para conjuntamente com o empresário avaliar qual o produto mais vantajoso, pois possuem outros objectivos e por vezes o empresário não revela toda a informação necessária para identificação do produto ideal.
Tesouraria é Tesouraria
Felizmente muitos dos pequenos, médios e grandes empresários não são doutores nem engenheiros, no entanto são visionários e persistentes trabalhadores, mas, infelizmente aprendem com os erros do passado e um dos erros mais comuns é a solicitação de apoios à tesouraria para a empresa que utilizam para investimento. Este procedimento é pouco correto, pois investimento deverá ser solicitado numa óptica de amortização a médio ou longo prazo enquanto que tesouraria possuem uma óptica de curto prazo.